Apesar de nem sempre serem notícia pelos melhores motivos, são hoje uma referência na cumplicidade entre o FC Porto e os seus adeptos. Falamos da principal claque oficial do FC Porto, que celebrou ontem 22 anos de vida, os 'Superdragões'.
A ilustrar o "post", 3 fotografias de coreografias dos 'Superdragões'. A primeira diz respeito ao jogo entre o FC Porto e o Manchester United, da Liga dos Campeões 2003/04. Um pano gigante com o dragão sentado numa poltrona e a inscrição, em baixo, "God save the King!". A segunda é uma foto no antigo Estádio das Antas com a coreografia da curva sul no início de um FC Porto - Sporting. Quanto à 3ª foto, regista a presença dos ultras em Sevilha na Final da Taça UEFA 2002/03.
Este grupo de ultras portistas foi fundado a 30 de Novembro de 1986 e teve origem na dissidência de alguns membros da 1ª primeira claque organizada do clube, os 'Dragões Azuis'. Insatisfeitos com a organização e dinâmica dos 'Dragões Azuis', alguns jovens sócios do FC Porto resolveram optar pela formação de um novo grupo de apoio ao FC Porto que passou a ficar situado na curva sul do antigo Estádio das Antas. Apesar das dificulades iniciais, os 'Superdragões' cresceram rapidamente e são hoje a maior claque portuguesa, com cerca de 103 núcleos espalhados por todo o país. No Estádio do Dragão têm sempre mais de dois mil lugares reservados, Porta 8, sectores 9 e 10. Além do crescimento exponencial em número de membros, os ultras do FC Porto também foram precursores noutras matérias. Além de terem sido a primeira claque portuguesa a ter a sua marca registada, os 'Superdragões' também foram pioneiros no fretar de aviões em nome próprio para acompanhar o FC Porto ao estrangeiro, a Barcelona (jogo frente ao Espanhol em 2000) e a Turim (jogo frente à Juventus em 2002), e em ambos os casos em dias da semana.
Contudo, o grande crescimento da claque nos últimos anos também originou dificuldades no relacionamento com os responsáveis do clube e com os próprios jogadores. Uma intimidade quase promíscua, como denunciava Costinha, em entrevista à revista Sábado em Novembro do 2004: "De dia ameaçavam os jogadores, à noite jantavam com dirigentes do FC Porto", referia o médio que deixou o FC Porto para jogar no Dínamo de Moscovo. O jogador reportava-se à época em que os 'Superdragões' invadiram um treino de Victor Fernandez antes de um jogo em Guimarães.
Mas para percebermos melhor a história e as motivações dos 'Superdragões', recuperamos uma entrevista dada ao JN por Daniel Seabra, Licenciado em Antropologia pela Universidade Fernando Pessoa, um dos maiores especialistas do país sobre claques e que investiga os 'Superdragões' há 16 anos.
A identidade dos 'Superdragões' está intimamente ligada à identificação com a cidade do Porto. Mas constrói-se também pela depreciação do adversário. Como funciona esta dualidade?
"A exaltação do clube tem no discurso de exaltação da cidade do Porto, por oposição ao Sul, um dos seus principais elementos. O discurso de diferenciação relativamente a Lisboa não é novo no clube e nem sequer foi inaugurado por Pinto da Costa ou José Maria Pedroto. Não deixa de reproduzir um discurso identitário que encontramos já no final do séc. XIX e início do séc. XX, por exemplo, nas palavras de Basílio Teles e Raul Brandão. Esse discurso tem profundidade histórica, sendo obviamente exacerbado no futebol."
Esse discurso de identidade negativa – os cânticos insultuosos – o que significa?
"Muitas vezes aquilo que pensamos que é real, é real nas suas consequências. Muitos adeptos do Porto vêm no Benfica o clube do Estado Novo que ganhava, não exactamente pelo seu mérito, mas pela protecção que gozava por parte das estruturas de poder sedeadas em Lisboa. Essa representação existe – e não estou a julgar a sua justeza ou a concordar com ela – e tem as suas consequências ao nível do discurso da claque. Esses cânticos, sobretudo os que são dirigidos ao Benfica - entendido como o principal adversário -, são evidentemente indesejáveis, reprováveis e inaceitáveis. Mantêm-se porque se inserem numa lógica de depreciação do principal adversário."
Nos 'Superdragões' os partidos políticos mais representados são o PS (22,1%) e o PSD (19,8%), havendo depois dois extremos: Bloco de Esquerda (9,2%) e Partido Nacional Renovador (7,6%). Como lê estes números?
"No PS e no PSD, os 'Superdragões' são um espelho do panorama no país. Os outros dois partidos estão sobre-representados. Aqueles que se identificam com o PNR não são necessariamente 'skinheads'. Mas o discurso nacionalista e xenófobo está presente. No entanto, é inaceitável considerar que as claques são um bando de nazis. Inaceitável e os dados confirmam isso mesmo."
Esses dois extremos convivem pacificamente?
"Sim. Ao contrário do que certamente alguns esperariam. Esse é mesmo um discurso instituído pelos líderes da claque. Não lhes interessa saber de que partido ou de que religião são os elementos do grupo; o que lhes interessa é que venham apoiar activamente o FC Porto. Nunca vi, em 16 anos, qualquer tipo de incidente deste tipo."
A identidade dos 'Superdragões' está intimamente ligada à identificação com a cidade do Porto. Mas constrói-se também pela depreciação do adversário. Como funciona esta dualidade?
"A exaltação do clube tem no discurso de exaltação da cidade do Porto, por oposição ao Sul, um dos seus principais elementos. O discurso de diferenciação relativamente a Lisboa não é novo no clube e nem sequer foi inaugurado por Pinto da Costa ou José Maria Pedroto. Não deixa de reproduzir um discurso identitário que encontramos já no final do séc. XIX e início do séc. XX, por exemplo, nas palavras de Basílio Teles e Raul Brandão. Esse discurso tem profundidade histórica, sendo obviamente exacerbado no futebol."
Esse discurso de identidade negativa – os cânticos insultuosos – o que significa?
"Muitas vezes aquilo que pensamos que é real, é real nas suas consequências. Muitos adeptos do Porto vêm no Benfica o clube do Estado Novo que ganhava, não exactamente pelo seu mérito, mas pela protecção que gozava por parte das estruturas de poder sedeadas em Lisboa. Essa representação existe – e não estou a julgar a sua justeza ou a concordar com ela – e tem as suas consequências ao nível do discurso da claque. Esses cânticos, sobretudo os que são dirigidos ao Benfica - entendido como o principal adversário -, são evidentemente indesejáveis, reprováveis e inaceitáveis. Mantêm-se porque se inserem numa lógica de depreciação do principal adversário."
Nos 'Superdragões' os partidos políticos mais representados são o PS (22,1%) e o PSD (19,8%), havendo depois dois extremos: Bloco de Esquerda (9,2%) e Partido Nacional Renovador (7,6%). Como lê estes números?
"No PS e no PSD, os 'Superdragões' são um espelho do panorama no país. Os outros dois partidos estão sobre-representados. Aqueles que se identificam com o PNR não são necessariamente 'skinheads'. Mas o discurso nacionalista e xenófobo está presente. No entanto, é inaceitável considerar que as claques são um bando de nazis. Inaceitável e os dados confirmam isso mesmo."
Esses dois extremos convivem pacificamente?
"Sim. Ao contrário do que certamente alguns esperariam. Esse é mesmo um discurso instituído pelos líderes da claque. Não lhes interessa saber de que partido ou de que religião são os elementos do grupo; o que lhes interessa é que venham apoiar activamente o FC Porto. Nunca vi, em 16 anos, qualquer tipo de incidente deste tipo."
Já foram também feitas, mas ainda não provadas, associações entre os 'Superdragões' e a guerra de gangs da noite do Porto. Qual é a sua perspectiva?
"É um facto que alguns dos detidos pela polícia na “Operação Noite Branca” frequentavam os 'Superdragões'. Frequência essa irregular e esporádica nalguns casos. Um dos detidos – Bruno Pidá – já não o via lá há muito tempo. A única ligação que consigo estabelecer, honestamente e sem especulação da minha parte, é a presença na claque. Novamente, acho abusivo associar uma claque a um gang. É verdade que houve essa presença e isso foi noticiado. Mas o que não é noticiado – e isso era interessante – é, por exemplo, o número de elementos dos 'Superdragões' que todos os anos concluem a sua licenciatura. Quanto à suposta associação que referiu não se pode tomar a nuvem por Juno. É uma generalização abusiva, gratuita e especulativa."
O núcleo duro dos 'Superdragões' está na Ribeira, como diz o seu líder Fernando Madureira?
"Em parte sim. Esse núcleo tem peso, sobretudo em desempenhos de agressividade. Mas essa ligação que é feita entre a direcção da claque e o núcleo da Ribeira, de onde Madureira é originário, tem que ser lida num contexto de posicionamento numa lógica de afirmação da Ribeira no seio da claque e da gestão das impressões que este núcleo pretende causar".
Qual é o peso real do núcleo da Ribeira?
"É o núcleo que marca uma presença forte em termos de número de elementos, sobretudo nas deslocações tradicionalmente mais difíceis e em que, às vezes, há confrontos. Aí a Ribeira manifesta a sua força e está em peso. Mas a Ribeira tem que ser reposicionada no peso relativo que tem no grupo. Quando eles vão todos à Luz temos que ver também que estão integrados num grupo que chega, por vezes, a atingir três mil elementos ou mais."
Os 'Superdragões' são também como o Porto quando dizemos que a cidade é um somatório dos seus bairros?
"Exactamente. Esta cidade tem mais de 40 bairros sociais e são bastantes os que estão representados nos 'Superdragões'. Depois há ainda os núcleos formados em círculos de amizades."
"É um facto que alguns dos detidos pela polícia na “Operação Noite Branca” frequentavam os 'Superdragões'. Frequência essa irregular e esporádica nalguns casos. Um dos detidos – Bruno Pidá – já não o via lá há muito tempo. A única ligação que consigo estabelecer, honestamente e sem especulação da minha parte, é a presença na claque. Novamente, acho abusivo associar uma claque a um gang. É verdade que houve essa presença e isso foi noticiado. Mas o que não é noticiado – e isso era interessante – é, por exemplo, o número de elementos dos 'Superdragões' que todos os anos concluem a sua licenciatura. Quanto à suposta associação que referiu não se pode tomar a nuvem por Juno. É uma generalização abusiva, gratuita e especulativa."
O núcleo duro dos 'Superdragões' está na Ribeira, como diz o seu líder Fernando Madureira?
"Em parte sim. Esse núcleo tem peso, sobretudo em desempenhos de agressividade. Mas essa ligação que é feita entre a direcção da claque e o núcleo da Ribeira, de onde Madureira é originário, tem que ser lida num contexto de posicionamento numa lógica de afirmação da Ribeira no seio da claque e da gestão das impressões que este núcleo pretende causar".
Qual é o peso real do núcleo da Ribeira?
"É o núcleo que marca uma presença forte em termos de número de elementos, sobretudo nas deslocações tradicionalmente mais difíceis e em que, às vezes, há confrontos. Aí a Ribeira manifesta a sua força e está em peso. Mas a Ribeira tem que ser reposicionada no peso relativo que tem no grupo. Quando eles vão todos à Luz temos que ver também que estão integrados num grupo que chega, por vezes, a atingir três mil elementos ou mais."
Os 'Superdragões' são também como o Porto quando dizemos que a cidade é um somatório dos seus bairros?
"Exactamente. Esta cidade tem mais de 40 bairros sociais e são bastantes os que estão representados nos 'Superdragões'. Depois há ainda os núcleos formados em círculos de amizades."
A ilustrar o "post", 3 fotografias de coreografias dos 'Superdragões'. A primeira diz respeito ao jogo entre o FC Porto e o Manchester United, da Liga dos Campeões 2003/04. Um pano gigante com o dragão sentado numa poltrona e a inscrição, em baixo, "God save the King!". A segunda é uma foto no antigo Estádio das Antas com a coreografia da curva sul no início de um FC Porto - Sporting. Quanto à 3ª foto, regista a presença dos ultras em Sevilha na Final da Taça UEFA 2002/03.
1 comentário:
Parabens SuperDragões ...
Palavras muito sabias do Doutor,ele
tb um grande Portista ...
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